Novo coronavírus e a decisão do Supremo Tribunal Federal

Inúmeras dúvidas pairaram em decorrência da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) quando julgou a ineficiência do art. 29 da caducada MP 927. As dúvidas consistem na caracterização ou não do novo coronavírus (Covid-19) como doença do trabalho.

Após a decisão do Supremo, diversas desinformações vêm sendo veiculadas, trazendo insegurança ao mundo do trabalho. Nesse sentido, publicamos na íntegra o parecer do jurídico da Confederação Nacional dos Trabalhadores de Segurança Privada (Contrasp) quanto ao tema.

Vamos direto ao ponto

A MP 927, aquela primeira que flexibilizou teletrabalho, férias e etc., tinha em seu corpo o artigo que falava o seguinte: "Art. 29. Os casos de contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal".

O que esse artigo queria dizer quando ainda vigente? Dizia que todo mundo que contraísse a Covid-19 precisaria comprovar que contraiu na empresa, pois a presunção seria de que ela não foi contraída no trabalho. Era uma questão de ônus da prova - caberia ao empregado comprovar. O STF afastou a eficácia do artigo em questão.

Mas o que a decisão do STF quis dizer com essa decisão de ineficácia desta norma? Que a Covid-19 é doença ligada ao trabalho? Não! A questão é remetida à regra geral, ou seja, cada caso será analisado individualmente, de acordo com a natureza da atividade e de como ela era desenvolvida.

A regra geral, em suma, está prevista do art. 20 da Lei 8.213 de 1991 que diz o seguinte:

Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:

a) a doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade laborativa;

d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho.

O inciso I do artigo, determina que serão consideradas como doença profissional, àquelas desenvolvidas pelo exercício do trabalho, podendo ser àquelas desenvolvidas por movimentos repetitivos, como por exemplo da LER (Lesão por Esforço Repetitivo).

Já o inciso II do artigo, também determina que serão consideradas como doença do trabalho, aquelas doenças adquiridas pela natureza da atividade, como por exemplo os profissionais da área de saúde, que pela natureza da atividade estão diretamente ligados ao risco.

Já a letra “d” do parágrafo 1º do referido artigo determina que as doenças endêmicas, aquelas que se manifestam com frequência em determinadas regiões, geralmente provocada por circunstâncias ou causas locais (caso do coronavírus), não são consideradas como doença do trabalho, salvo se devidamente comprovado que é resultante da efetiva exposição do trabalhador à doença.

Assim, a decisão imputou aos empregadores a obrigatoriedade de implementarem em suas empresas medidas de segurança ainda mais rígidas relativas à Covid-19, com o objetivo de afastar o nexo de causalidade da doença adquirida pelos seus empregados com a atividade laboral.

Neste caso, caso o trabalhador venha a ser acometido com a Covid-19, este terá que comprovar o nexo de causalidade da sua doença com a atividade desenvolvida. Em outras palavras, o empregado poderá alegar que não recebia os EPIs de forma correta, que a empresa não estava realizando a assepsia de forma correta no ambiente de trabalho ou, ainda, alegar que o critério de distanciamento não estava sendo observado no ambiente laboral.

Uma empresa que, por exemplo, toma medidas de segurança (máscaras, álcool em gel, distanciamento...) e um único empregado ali contrai a Covid-19 provavelmente não verá reconhecida a doença desse trabalhador como acidente do trabalho.

Por outro lado, a empresa onde as medidas de segurança são ignoradas e alguns empregados contraiam a Covid-19 provavelmente vai enfrentar reconhecimentos de nexo de causalidade da doença com o trabalho, e consequente indenizações/estabilidades correspondentes, caso preencha os requisitos.

Em suma, não se pode dizer, de forma alguma, que o STF decidiu que a Covid-19 é doença do trabalho ou acidente de trabalho. É claro que a decisão afasta o peso do empregado em lutar contra uma presunção, facilitando seu caminho. Mas, de forma alguma, permite a presunção contrária, no sentido de que todos os trabalhadores que forem acometidos pela Covid-19 terão direito à emissão da CAT, para direitos futuros, não.

É tempo de cautela do empregador e de proteção aos trabalhadores em todos os momentos, se não por conscientização, no mínimo por "medo" da responsabilização econômica que pode vir.

Conclusão  

Não se pode dizer, de forma alguma, que o STF tenha decidido que a Covid-19 seja doença do trabalho ou acidente de trabalho. Passou o tema a ser uma questão de ônus da prova e caberia ao empregado lutar contra a presunção.

Assim, comprovada a não observância das regras de segurança, por conduta negligente da empresa, colocando em risco a integridade física dos seus empregados, há nexo causal apto a imputar a responsabilidade empresa pela ocorrência da doença ocupacional. Contudo, se na particularidade do caso, por exemplo, ficar evidenciada a culpa exclusiva da vítima por ter contraído Covid-19, naturalmente rompe-se o nexo de causalidade, afastando o coronavírus como doença equiparada a acidente do trabalho.

Jardim Pietroski Advocacia

Fonte: Contrasp, com informações Dra. Karen Jardim, advogada da Contrasp.

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